Frente ao novo paradigma da inclusão de crianças
especiais no ensino regular, o fonoaudiólogo cada vez mais tem exercido papel
fundamental na orientação dos educadores sobre o papel da linguagem no processo
de alfabetização. Encontramos no discurso dos educadores falas como "ele
não fala, como vai poder escrever e acompanhar a turma?", "como posso
eu trabalhar com ele sem deixar os outros de lado?". Essas falas mostram o
quanto essas crianças permanecem à margem do processo escolar, tanto por suas
dificuldades específicas, tanto pela dificuldade do professor em acolhê-las. É
nesse momento que o fonoaudiólogo entra em cena acolhendo esses alunos,
orientando os educadores e abrindo possibilidades de significação para as
"coisas sem sentido" que trazem esses alunos.
Vemos assim que o fonoaudiólogo não é aquele que apenas
identifica sintomas clínicos dentro da escola (via triagens) e encaminha essas
crianças para o atendimento clínico. Nosso objetivo vai além disto. Propomo-nos
ser parceiros da escola, acolhendo as angústias dos educadores, dos pais e das
crianças. O fonoaudiólogo atua na possibilidade de circular sentidos,
significantes que, às vezes, se mostram fixos na fala dos pais e educadores,
como por exemplo "ele não vai aprender nada porque tem Síndrome de
Down". Será que a criança precisa ficar nesta posição ou ela pode ganhar
outro lugar?
Como diz a Ana Cláudia Navarro Lins, "um lugar na
escola faz diferença". As crianças quando estão na escola, se beneficiam
do encontro com a cultura, com a troca e com a circulação social que a escola
prevê e na maioria das vezes as crianças participam com as outras crianças e
suas necessidades são tão especiais quanto às de qualquer criança: aprender,
brincar, desenhar, contar histórias.É muito difícil para as pessoas envolvidas
com a criança, pais e educadores, lidar com os diferentes impasses que a
criança com necessidade educativa especial passa. Ás vezes, elas estacionam no
seu processo de aquisição e desenvolvimento da linguagem oral e/ou escrita.
Esses alunos escapam à possibilidade de serem significados no discurso da
equipe justamente por apresentarem comportamentos estranhos ao ideal do
educador que não consegue mais dar sentido para as produções da criança.O
fonoaudiólogo procura, nesse sentido, apontar para outras possibilidades,
acompanhando e orientando a equipe de como a linguagem pode passar a circular
na fala da criança e do outro que a acompanha nesse processo. É necessário que
acompanhemos tanto o aluno quanto à equipe. Apostamos que o professor possa ser
"companheiro" da linguagem dessas crianças. Que ele reconheça na fala
da criança, nos gestos, no próprio "erro", a presença da criança, de
um sujeito na linguagem. Essa posição da criança pede apenas interpretação e
não forma de superação.É assim que esperamos contribuir com o conhecimento da
Fonoaudiologia, da linguagem, passando a considerar essas crianças também em
sua subjetividade e não se limitando as suas dificuldades orgânicas.
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